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Pedro Adolfo Savoldi, Advogado
Pedro Adolfo Savoldi
Comentário · há 5 anos
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Pedro Adolfo Savoldi, Advogado
Pedro Adolfo Savoldi
Comentário · há 5 anos
Sergio, eu comentei o estudo usado como referência no decreto do presidente. Não que isso faça que esse estudo em particular se sobreponha aos demais, mas o fato de que o estudo utilizado para corroborar o argumento do presidente já contradiz esse próprio argumento é algo a se considerar.
Outra coisa a se analisar é que esse estudo ainda menciona que "a literatura é extensa e amplamente questionada", uma vez que os especialistas entendem que o crime é um "fenômeno complexo e multidimensional" demais para ser reduzido dessa forma.

Nesse sentido, vou deixar aqui um trecho da matéria que encontrei sobre esse estudo:

"No geral, a maior parte dos estudos recentes sobre o tema vai contra a afirmação de que uma maior quantidade de armas em circulação ajuda a conter a criminalidade. Em outubro de 2017, o doutorando em economia Thomas Conti revisou a literatura publicada sobre o tema em um período de cinco anos e traduziu os resumos de 61 pesquisas publicadas entre 2013 e outubro de 2017. O pesquisador deu preferência a artigos já publicados ou em vias de publicação em periódicos acadêmicos de qualidade e com revisão por pares.

Segundo o levantamento, 90% das revisões de literatura são contrárias à tese “mais armas, menos crimes”. Das 10 revisões ou meta-análises publicadas em periódicos com revisão por pares entre 2012 e 2017, nove concluíram que a literatura empírica disponível é amplamente favorável à conclusão de que a quantidade de armas gera efeitos sobre os homicídios, a violência letal e alguns outros tipos de crime. Inclusive, segundo ele, o melhor estudo internacional, 'mais metodologicamente rigoroso', é 100% contrário à tese.

Além das revisões de literatura, Conti identificou 34 publicações de estudos empíricos com conclusões contrárias à ideia que o aumento do número de armas em circulação diminui a quantidade de crimes. Apenas sete publicações têm conclusões favoráveis à alguma versão dessa hipótese. Quando se trata do Brasil, as pesquisas nacionais corroboram amplamente a hipótese de que o crescimento do número de armas está associado com aumento de crimes e/ou de violência."¹

Ou seja, não se nega que existam estudos apontando que o aumento no número de armas cause uma diminuição nas taxas de violência. Mas todos os estudos que eu vi nesse sentido (incluindo aí o comentário do colega Matheus Gaeski, que, diga-se de passagem, vem sendo copiado e colado em todos os sites e comentários que tratam do assunto, por várias pessoas diferentes) são muito "forçados" na análise dos números e as conclusões que tiram. Um exemplo no comentário dele é a suposta taxa de homicídios da Inglaterra ser 4 vezes maior que a dos EUA. Tem vários outros comentários desmentindo esse dado e qualquer análise de dados nesse sentido mostra que isso não é verdade².

Mas, no mais, quero deixar claro que na minha opinião (e seguindo a conclusão do estudo citado no decreto, de que o fenômeno da criminalidade não pode ser reduzida a esse tipo de análises estatísticas simplistas), tenho que os estudos que dizem comprovar a tese contrária também podem ser bastante "forçados". Mas não se pode negar que a grande maioria aponta que o aumento de armas está ligado ao aumento da violência.

De qualquer modo, o fato é que a autoridade atribuída aos artigos pró-armamentistas que você cita derivam somente da origem deles, e não do seu conteúdo. O comentário do Matheus cita o "estudo de Harvard" para depois enumerar uma série de conclusões e números extremamente imprecisos; já o seu comentário cita o fato de que os seus estudos vem do "Canadá, o país que mais se dedica ao estudo da criminologia". Essa sua conclusão me parece bem semelhante àquelas dos artigos pró-armamentistas. Afinal, quem mede a dedicação do estudo da criminologia por países? Há conclusões sobre esse assunto que só me parecem muito vagas para serem tratadas como respostas absolutas.

No mais, quero reiterar novamente o que é dito no estudo ao qual o decreto do presidente fez referência: o aumento ou diminuição nas taxas de criminalidade é algo muito difícil de ser medido levando em consideração um único fator isolado (nesse caso, a flexibilização do acesso a armas de fogo). Não obstante isso, a grande maioria dos estudos indica que a conclusão mais coerente é no sentido de que o aumento no número de armas reflete no aumento da violência.

Agora, uma análise mais filtrada que poderíamos fazer - e que, justamente por ser mais especifica, acho que poderia sim ser demonstrada mais precisamente por números - é a relação entre essa flexibilização no acesso às armas de fogo e o aumento de homicídios decorrentes de violência doméstica que, imagino, inevitavelmente irá ocorrer.
Essa sim é uma taxa que imagino que terá um crescimento considerável no Brasil e cujos números vão ser não somente muito fáceis de correlacionar com a flexibilização do acesso às armas, mas serão inseparáveis (o que não vai ser problema para a retórica e manobras interpretativas dos muitos artigos pró-armamentistas que ainda virão para tentar disfarçar).

Enfim, li a chamada "extensa relação" trazida pelo colega Matheus Gaeski e também poderia ler o artigo que "inclusive é do Canadá", mas reitero que o estudo realizado pelo Ipea e mencionado pelo presidente já fizeram o favor de realizar um levantamento entre os principais artigos conflitantes sobre o assunto.
No mais, espero que essa discussão ainda dure bastante tempo, para que eu possa ter a oportunidade de trazer aqui algum futuro estudo sobre o aumento de homicídios com arma de fogo decorrentes de violência doméstica.

Continuo convencido que é tudo isso é somente uma questão de "querer ter uma arma", uma questão de desejos individuais, cuja base é, por um lado, o fascínio pela arma de fogo, que algo que eu até entendo, mas que não vejo conexão nenhuma com os debates sobre a diminuição da violência, e por outro lado, a sensação de segurança (que não é sinônimo de segurança) que a arma pode trazer, muito embora a maioria dos estudos demonstre ser um equívoco. E é aí que entram os artigos pró-armamentistas: eles não precisam ser precisos, só precisam confirmar aquilo que a nossa paixão quer que seja confirmado.

[1] https://aosfatos.org/noticias/o-que-dizem-os-estudos-sobre-os-efeitos-da-flexibilizacao-da-posse-de-armas/
[2] https://data.worldbank.org/indicator/VC.IHR.PSRC.P5
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Pedro Adolfo Savoldi, Advogado
Pedro Adolfo Savoldi
Comentário · há 5 anos
Não confundam ESTUDOS que demonstram que a flexibilização ao acesso à arma de fogo aumenta os índices de violência com "ideologia de esquerda".

- Um estudo da Universidade de Stanford mostrou que as lesões relacionadas a armas são a segunda principal causa de morte de crianças nos Estados Unidos, sendo duas vezes mais comuns em estados com leis de armas mais brandas do que aqueles onde há controle rigoroso.

- O estudo do Ipea usado como referência no próprio decreto indicou que o
Estatuto do Desarmamento rompeu com uma escalada de homicídios que vinha desde 1980. Entre os anos de 1995 a 2003, a taxa de homicídio cresceu 21,4%, enquanto de 2003 a 2012 reduziu para 0,3%.

- A taxa anual de mortes por agressão, após o estatuto, passou de 2,22% ao ano para 0,29%.

Na era da pós-verdade, analisar fatos que trazem conclusões que não nos agradam virou "de esquerda", e se é "de esquerda" é automaticamente errado, independente dos números.
Vejo muitas manifestações sobre coragem, conclusões intrínsecas e manobras retóricas para desqualificar os comentários que se posicionam de maneira contrária ao decreto do presidente, mas não vejo nenhum argumento.
Apenas digam "eu defendo essa ideia porque eu gosto/quero ter uma arma", não com dados imaginários sobre Segurança Pública.
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